/Para que casar?

      

                           Jorge Forbes

 

– Para que casar? Coisa mais antiga! Nós não precisamos disso, estamos juntos, nos amamos e basta. Não vamos ficar dando bola para a torcida, gastando dinheiro em recepção, pagando mico na frente dos amigos. Isso é coisa velha, já era. Casar não faz a menor diferença.

Certo? Errado.

Fato é que não é a mesma coisa viver junto, mesmo por muito tempo, e proclamar esse amor em público, em data e
hora determinada. É pagar um mico? Claro que é, um mico inevitável, entendamos por quê.

Todo amor tem algo de ridículo, como rimou Álvaro de Campos (Fernando Pessoa): todas as cartas de amor são ridículas. E não seriam cartas de amor se não fossem… O ridículo do amor está no aspecto de que nunca conseguimos dar uma boa razão por amarmos alguém. Nem mesmo para a própria pessoa amada, daí a ironia que fazemos com qualquer tentativa de discutir a relação, até o ponto de termos criado a sigla que provoca sorrisos: ‘dr’. Relação não se discute, se vive, se curte, ou se separa. Cobranças, ataques de mentiras e verdades, intrigas, espionagens, nada disso presta para o amor, uma vez que sua essência é de outra ordem que aquelas captadas por esses meios. Amor começa na palavra, mas só ganha sentido no corpo. E nele, a palavra vira murmúrio, daí ridícula, por ser estranha às convenções bem postas.

O amor e suas palavras, por serem tão estranhos, inclusive aos amantes, provocam, com frequência, o desejo de ter
um lugar no mundo, em uma carta, em um casamento, em um ato no qual se assuma o estar bobo por alguém. Quem não sabe que os maiores fofoqueiros de casos escondidos são os próprios cúmplices? Por isso: pela vontade de publicar sua escolha. – Eu contei só para meu melhor amigo; – Eu contei só para minha maior amiga. Eles se confessam.

Pode, a cerimônia, ter ou não padre ou juiz de paz, o que não pode faltar é o convite, o momento, e os amigos avisados do que vai acontecer. Como o amor não se explica, o que os amantes fazem é testemunharem – não explicarem – o que sentem. Testemunhar, dizia Jacques Lacan, vem de “testis”, que está na origem de “testículo”. O aval do testemunho não é a razão, é um pedaço selecionado do corpo. E que pedaço! Casar consolida, afirma, inscreve a bobagem de cada um no mundo, propiciando novas e múltiplas expressões de um relacionamento, entre elas, a de maior relevância, os filhos.

O amor pede esse sacrifício para se consagrar, para ser sagrado, pois é laço de outro mundo, além da palavra. O poeta tem bem razão: – Todas as cartas de amor – como os casamentos – são ridículas. Mas, conclui ele: – Só as criaturas que nunca escreveram cartas de amor é que são ridículas.

Pá!

 

(publicado na revista Gente IstoÉ – julho 2013)