/De Leny Magalhães Mrech: A Prevenção na Saúde e na Educação

O Admirável Mundo Novo da Sociedade Contemporânea

Há muitos anos atrás eu pensei que o behaviorismo havia acabado. Hoje constato que não só ele não morreu, como se encontra bastante ativo nas práticas preventivas na sociedade contemporânea. Nas práticas de observação e controle da sociedade contemporânea

Quando o bebê nasce, nas maternidades de classe média alta, ele é acompanhado, desde o início, através de uma câmara de televisão. Seus pais podem observar os seus primeiros movimentos no quarto do hospital. Para as populações mais pobres, sequer os procedimentos mínimos existem. Bebês são trocados, com um grande impacto para as suas famílias.

Nas escolas de classe alta as crianças podem ser acompanhadas em sua freqüência, ao longo de vários momentos no dia. Um simples telefonema à escola, uma consulta aos sites das escolas na Internet, basta para os pais solucionarem a sua curiosidade. Para as escolas públicas mais pobres o que funcionam são as grades. Alunos, funcionários e professores se encontram enjaulados.

Para os professores das elites o tempo também mudou. Hoje eles têm câmaras acompanhando o seu trabalho. Os alunos são vigiados no recreio. Mais uma vez a justificativa é que é preciso prevenir. Um dos exemplos mais famosos deste processo foi o que houve na semana passada com uma criança de cinco anos nos Estados Unidos. Ela bateu na professora. Foi tratada como uma simples criminosa e presa na cadeia por um dia.

Para os professores das camadas mais pobres da população o descaso é uma constante. Falta giz, apagador, as carteiras das salas de aulas estão quebradas, e isso sem falar em prédios de lata, onde a chuva e o calor impedem que alunos e professores se concentrem na aula.

Você acha que este processo é diferente nos bancos? O Admirável mundo novo manda lembranças. Você vai ser filmado o tempo todo. A sua imagem pode ser utilizada da forma como eles quiserem. Na semana passada um colega foi ao banco e foi filmado por uma câmara. Ele perguntou para que serviria aquele material. A pessoa lhe disse que era para uma campanha do banco. Ele disse que não queria que a sua imagem fosse ventilada na campanha do banco. A pessoa estranhou porque partia do pressuposto que todas as pessoas gostariam que suas imagens fossem utilizadas.

Quem é profissional liberal já viveu situações, onde ao dar uma entrevista para um determinado veículo informativo, seus dados foram transpostos para outros sem a sua anuência.

Na Saúde a situação é ainda mais caótica. Pois somos constantemente estimulados a nos prevenir o tempo todo. Contudo, a grande questão permanece: Prevenir contra o quê? Como? A partir de que critérios? Os parâmetros que os médicos utilizam para fazer as suas análises mudam o tempo todo. Agora eles os abaixaram tanto que nos tornamos pré-doentes, ou seja, aqueles que se encontram saudáveis no momento; mas que potencialmente podem vir a se tornar doentes.

O que a Psicanálise tem a dizer a respeito de tudo isso? Ela revela os encaminhamentos neuróticos da sociedade contemporânea. A tentativas de deter as doenças, a morte. A busca de uma Saúde e Educação perfeitas.

Práticas que cada vez mais se pautam em práticas higienistas antigas. Práticas que normatizam o que comer, o que vestir, de que maneira dizer certas coisas, o que pensar, o que sentir, etc. A instituição de um protocolo das mídias eletrônicas e televisivas do século XXI, pautado no higienismo do final do século XIX e início do século XX. Só que agora imbuído de uma crença ampliada de que é possível controlar a Saúde, a Educação e a Morte.

Frente a tudo isso, a Psicanálise revela que a falha é inevitável, assim como a doença e a morte. Em algum momento elas vão nos atingir porque elas fazem parte do real. Um real que nós queremos controlar transformando-o em simples realidade.

Os filmes Admirável Mundo Novo, Gattaca, 1984, dentre tantos outros anteciparam o futuro. A grande questão que fica diz respeito à ética. É isso que nós realmente queremos?